domingo, 16 de setembro de 2012

Teologia do Corpo - A Segunda Descoberta do Sexo


O livro do Gênesis narra que, ao criar o homem e colocá-lo no jardim do Éden “Iahweh Deus deu ao homem este mandamento: ‘Podes comer de todas as árvores do jardim. Mas da árvore do conhecimento do bem e do mal não comerás, porque no dia em que comeres terás que morrer” (Gn 2,16-17). Sabemos que, na sequência da narrativa, foi exatamente o que aconteceu. A morte a que Deus se referia não era tão somente a morte corporal, mas também a espiritual. Ou seja, espiritualmente os corpos do homem (Adão) e da mulher (Eva), após a desobediência, já não trazem mais a plenitude do Espírito de Deus que os permitia experimentar a comunhão e o amor de Deus em sua totalidade. Agora, de certa forma, sentindo-se “vazios” do amor de Deus, começam a perceber que o olhar que tinham e o desejo que sentiam um pelo outro mudou completamente. Uma das consequências imediatas disso diz respeito ao desejo sexual que ambos sentiam um pelo outro: antes, o desejo sexual era o poder de tornar-se dom um para o outro, agora o desejo que brota em cada um é de simplesmente “agarrar-se” e “possuir-se” mutuamente para a própria gratificação. Daí nasce a luxúria, e o Papa João Paulo II afirma que “o relacionamento de doação tornou-se um relacionamento de apropriação”. “Apoderar-se” aqui pode ser entendido como desejo de posse, desejo de usufruir do outro para o seu bel prazer, numa visão utilitarista que torna o outro um mero objeto.
O Papa chama a tudo isso de “segunda descoberta do sexo”; porque justamente a paz e a tranquilidade total da primeira descoberta do sexo é quebrada por uma certa “ameaça” que o outro representa. Por que agora sentem ameaça? Porque originalmente seus corpos nus revelavam toda a dignidade da semelhança divina que haviam adquirido desde a criação. Mas agora eles, instintivamente, escodem sua nudez do olhar do outro porque sentem que esse olhar torna-se uma ameaça à própria dignidade. É o que acontece até hoje na nossa experiência cotidiana, e a isso denominamos vergonha.
Podemos entender a vergonha sob dois aspectos: o primeiro indica exatamente que homem e mulher não conseguem mais perceber o significado esponsal de seus corpos, ou seja, não conseguem mais perceber o amor que Deus tinha estampado em seus próprios corpos através da sua sexualidade. O segundo aspecto da vergonha está relacionado diretamente com a necessidade de proteger o corpo contra o olhar da luxúria. Ou seja, a necessidade de não deixar o corpo tornar-se mero objeto de desejo do outro e, desse modo, preservar a dignidade da própria pessoa. Nesse ponto o Papa afirma que a luxúria “passa sobre as ruínas” do significado esponsal do corpo só para satisfazer sua “necessidade sexual”. Assim, a luxúria  deixa de lado a comunhão de pessoas que havia no início e busca apenas uma satisfação do desejo sexual.
Olhando para a realidade à nossa volta é que podemos entender porque se fala tanto hoje nos “benefícios” que a luxúria pode trazer ao desempenho sexual, porque simplesmente ela foca na intensificação do desejo sexual e na maximização do prazer; o que reflete apenas uma dimensão totalmente distorcida da realidade de comunhão de amor inscrita por Deus em nossos corpos. Nesse aspecto, o ato de entregar-se à luxúria poderia ser comparado com o fato de alguém que sente fome e ao invés de buscar comida boa e saudável, mata a fome comendo lixo. Por que lixo? Porque o homem decaído não acredita mais no verdadeiro dom do banquete que Deus tem preparado para ele, mas contenta-se apenas com o lixo. Mais ainda, aqueles que têm consciência do problema da luxúria acusam seus corpos como a fonte provocadora da mesma. Claro que tudo não passa de uma desculpa para não se encarar a fonte de toda a luxúria: a desordem do coração. Em outras palavras, o problema da luxúria não está no corpo, mas no coração. Ou seja, enquanto não procurarmos ordenar o nosso coração para o verdadeiro amor infundido por Deus em nós, jamais conseguiremos viver de acordo com a imagem de homens e mulheres ao qual fomos criados conforme o desígnio divino.
Percebemos então que, após a experiência do pecado no mundo, homem e mulher foram fortemente afetados por uma desordem que, nas palavras do Papa, fez com que seus corações “se tornassem um campo de batalha entre o amor e a luxúria”. E qual a solução para amenizar ou sanar essa desordem? A Boa Nova de Cristo e a adesão à sua pessoa é justamente o dom divino que nos leva a experimentar novamente um pouquinho daquela harmonia profunda que se encontrava no coração do homem e da mulher antes do pecado. E isso nos dá a certeza de que não estamos à mercê de nossas fraquezas e de nossos pecados. Cristo veio justamente para libertar-nos das correntes do pecado da luxúria e de todos os outros pecados. É somente Nele que somos livres para amar segundo o plano original de Deus.

Pe. Idamor da Mota Jr

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