domingo, 16 de setembro de 2012

Teologia do Corpo - O Etos do Coração


Na sua discussão com os fariseus, Jesus exige deles sempre uma nova moralidade que vá além do mero seguimento de normas. Lembremos suas palavra no sermão da montanha: “Ouvistes o que foi dito: não cometerás adultério. Eu, porém, vos digo: todo aquele que olha para uma mulher com desejo libidinoso já cometeu adultério com ela em seu coração” (Mt 5,27-28). Com relação à essas palavras de Jesus o Papa diz que a “alusão ao coração põe em evidência a dimensão da interioridade humana, a dimensão do homem interior, própria da ética, e mais da teologia do corpo”.
Jesus então, começa a preparar o homem para uma nova moralidade quando ele diz: “Se a vossa justiça não for maior do que a dos escribas e fariseus, não entrareis no reino dos céus” (Mt 5,20). Por que Jesus usa os escribas e fariseus como exemplos? Justamente esses que eram considerados os mais justos e os mais fiéis seguidores da Lei? A crítica de Jesus está justamente neste ponto. Para muitos fariseus e escribas suas atitudes no cumprimento rigoroso da Lei não passava de mera exterioridade. E Jesus sabia disso, porque embora eles seguissem a ética rigorosa da Lei, seus “etos” não viviam de acordo com o que praticavam.
Precisamos saber então a diferença entre ‘ética’ e ‘etos’. A grosso modo a ética está relacionada ao conjunto de valores aceitos e vividos por um grupo social humano que geralmente é colocado como norma (moral). O ‘etos’ ou ‘ethos’ está relacionado aos valores apreendidos e vividos por um indivíduo em particular. Desse modo, por exemplo, pode haver uma ética vigente dentro de uma sociedade que não seja o ‘etos’ particular de um indivíduo. Daí a crítica de Jesus com os fariseus e escribas. Estes seguiam rigorosamente a ética da lei, mas seus ‘etos’ continuavam tortos.
Ora, sabemos que é possível seguirmos regras sem jamais entendê-las ou aceitá-las interiormente. A esse seguimento rígido de regras chamamos de ‘legalismo’ ou ‘moralismo’. Por causa dessa disparidade entre o que está no coração e o que se vive exteriormente é que Cristo, no sermão da montanha, nos convida para vivermos algo bem diferente: para uma moralidade que brote do coração.
Assim, podemos afirmar que o ‘ethos’ de um indivíduo se forma dentro do seu caráter; que nada mais é do que o mundo interior de valores, virtudes, hábitos e até mesmo vícios. Então, no sermão da montanha, assim como em todas as suas pregações, Cristo não está só preocupado em nos transmitir um código de ética, mas quer que assimilemos no interior do nosso coração os valores mais profundos de suas palavras e dos próprios Mandamentos de Deus.
Quando Ele se refere ao adultério, por exemplo, Ele sabe que por muitas vezes os homens ouvem e conhecem o que ético ou normativo: “não cometerás adultério”. Porém, podem acabar cometendo adultério não só em ato como em desejo (luxúria). E isso porque o caráter do homem é falho, ou seja, seu ‘etos’ não está em consonância com a ética.
Porém, aqui está o grande ensinamento de Cristo. Mesmo sabendo que o coração do homem pode ceder à luxúria, Ele insiste em dizer: “Não ceda à Luxúria!”. À primeira vista isso parece ser simples, mas na nossa experiência cotidiana não é sempre assim. O que fazer então? É aqui justamente que o Evangelho de Cristo vem ressoar como a Boa Nova, porque, segundo o Papa, o ‘caráter novo’, proclamado por Cristo no Sermão da Montanha, não nos é dado somente como tarefa, mas sim como dom. Em outras palavras, não estamos à mercê de nossas fraquezas e pecados, mas é o Espírito do Senhor que pode nos moldar e mudar nossos desejos. Por isso o Papa vem nos dizer que “o caráter cristão identifica-se pela transformação da consciência e das atitudes tanto do homem como da mulher, de forma a expressar e realizar o valor do corpo e do sexo conforme o plano original do Criador”.
Eis aqui a grandeza desse ensinamento de Cristo: não somos reféns da luxúria e de nenhum outro pecado em geral. Em Cristo somos livres. A Boa Nova de Cristo consiste exatamente em sermos livres para amar segundo o plano de Deus. E quando deixamos o Espírito do Senhor moldar o nosso coração, experimentamos essa liberdade como uma ‘moral viva’, na qual realizamos o verdadeiro sentido de nossa humanidade. Portanto, para vivermos sempre mais essa liberdade dos filhos de Deus é preciso unirmo-nos sempre mais à pessoa de Cristo para que o nosso etos seja tal qual o dele.

Pe. Idamor da Mota Jr

Nenhum comentário:

Postar um comentário