segunda-feira, 6 de junho de 2011

Sobre as uniões do mesmo sexo


Recentemente fui questionado sobre a razão pela qual um “casal” homossexual não pode ser considerado como família assim como foi prevista na decisão do STF (Supremo Tribunal Federal). Eis aqui a minha resposta pessoal que julgo estar em consonância com a posição da Igreja Católica.
Para a Igreja a instituição familiar é de tal importância que torna-se a base vital para a sociedade. A família é, por definição, constituída por um homem e uma mulher, unidos em matrimônio, juntamente com seus filhos. De acordo com a doutrina do Catecismo da Igreja Católica essa configuração familiar “precede todo e qualquer reconhecimento por parte da autoridade pública e impõe-se a ela” (CIC n. 2202) ou ainda como foi expresso pela nota da CNBB “o matrimônio natural entre o homem e mulher bem como a família monogâmica constituem um princípio fundamental do Direito Natural”. Ambas afirmações partem do princípio de que o matrimônio, como união entre um homem e uma mulher, é uma instituição natural porque assim foi criada e querida por Deus: “Ao criar o homem e a mulher, Deus instituiu a família humana e dotou-a da sua constituição fundamental” (CIC n. 2203). Desse modo a união de pessoas do mesmo sexo jamais poderá ser considerada como família porque parte do princípio de que o ser humano, enquanto criado por Deus como homem e mulher, é intrinsecamente ordenado para uma complementaridade e reciprocidade que marcam a estrutura essencial da nossa humanidade como masculino e feminino. Em outras palavras, o homem e a mulher são orientados naturalmente um para o outro, tanto e de tal modo que  o nosso próprio corpo, enquanto masculino ou feminino, já traz a marca dessa estrutura manifestando a nossa identidade originária. Portanto, “a diferença sexual é originária e não mero produto de uma opção cultural” (nota da CNBB) como afirma a cultura pansexualista que se quer promover hoje na sociedade, o que reduz a sexualidade humana a simples objeto de prazer ou de opções, desvalorizando-a e sem buscar uma profunda significação da mesma. Além do mais, a família, como célula originária da vida social, tem como finalidade a procriação e educação dos filhos. Tal missão da família, cuja estrutura tem se mostrado eficaz ao longo da história humana, não pode ser equiparada a uniões de pessoas do mesmo sexo, pois fazê-lo seria descaracterizar sua identidade e ameaçar a estabilidade da mesma. Tem sido assim ao longo da história humana e nas sociedades, o que coloca a família como um “recurso humano e social incomparável, além de ser uma grande benfeitora da humanidade” (nota da CNBB). Sob o ponto de vista cristão a instituição familiar assume um papel tão fundamental que o próprio Deus quis abençoar o matrimônio e elevá-lo à dignidade de Sacramento, desse modo homem e mulher são chamados a assumir uma missão bela e única enquanto desígnio divino de serem uma só carne e de frutificarem e multiplicarem-se de acordo com a vontade do Criador (cf. Gn 1,27; 2,24).
Uma outra pergunta com relação ao tema diz respeito à alegação do STF de que a sua decisão teria base numa nova configuração da sociedade. O Ministro Joaquim Barbosa, por exemplo, foi totalmente a favor a decisão. Segundo ele, a “dignidade humana é a noção de que todos, sem exceção, têm direito a uma igual consideração”. Por que permitir uma união homoafetiva não seria promover a dignidade humana?
Vale ressaltar aqui a interpretação e o conceito que se tem de dignidade humana que ao meu ver ficou tão banalizado de tal modo que é usado hoje em dia para se argumentar todo e qualquer tipo de “direito” que se queira reivindicar. O princípio filosófico que rege esse conceito foi cunhado principalmente pelo filósofo Immanuel Kant que basicamente defendia que as pessoas deveriam ser tratadas como um fim em si mesmas e não como meios ou objetos. Desse modo a dignidade humana pode ser entendida, em outras palavras, como um valor moral ou espiritual inerente à pessoa humana. Isso significa que buscar a dignidade humana significa antes de tudo buscar conhecer a natureza do próprio ser humano. O que eu posso conhecer, fazer ou esperar, depende da minha própria condição humana. Assim, não tem sentido dizer que a união de duas pessoas do mesmo sexo promove a dignidade humana das mesmas porque a dignidade não está baseada somente em direitos adquiridos pelo meio legal e jurídico, mas tem a ver primeiramente com a busca do conhecimento da natureza da pessoa humana. Nesse caso específico, deveria discutir-se primeiramente a autenticidade de tal união considerando-se a natureza da constituição originária do ser humano que é um ser sexuado nas formas masculina ou feminina. O fato de não se considerar ou não reconhecer uniões de pessoas do mesmo sexo não implica em hipótese alguma negar a dignidade das pessoas em questão, pois as mesmas já tem sua dignidade pelo simples fato de serem pessoas. Isso sim dever ser respeitado e considerado, por isso a legislação deve evitar qualquer forma de “discriminação e violência que firam a dignidade da pessoa humana” (CIC 2358). Não concordar ou não reconhecer a união de pessoas do mesmo sexo sob a forma de matrimônio, de forma alguma pode ser considerado discriminação muito menos “homofobia” como alguns querem afirmar hoje. Primeiramente porque cada um de nós é livre para expressar aquilo que pensamos e opinamos; por isso, alguém dizer que é contra tais tipos de uniões faz parte do exercício dessa liberdade de expressão que é inerente a cada indivíduo num estado democrático e de direito; segundo, de acordo com o ponto de vista Cristão e da Igreja, conforme o que já foi exposto acima, o princípio da instituição familiar afirma que a mesma é de natureza divina e de acordo com o próprio texto da nossa Carta Magna é uma “entidade constituída pela união de um homem e uma mulher e seus descendentes” (art. 226, § 1º, 2º, 3º, 4º e 5º), texto este que os próprios constituintes, na época dos debates de elaboração, inclusive o relator, entenderam que era relevante fazê-lo, para evitar qualquer outra interpretação, como a de que o conceito pudesse abranger a união de pessoas do mesmo sexo. Assim, escreveu recentemente o advogado Ives Gandra da Silva Martins: “aos pares do mesmo sexo não se exclui nenhum direito, mas decididamente, sua união não era – para os constituintes – uma família”. O mesmo afirma ainda que questão idêntica foi colocada recentemente (27/01/2011) à Corte Constitucional da França, que por sua vez teve a prudência de declarar que cabe ao Legislativo e nunca ao Judiciário legislar sobre uniões do mesmo sexo, “pois a relação entre um homem e uma mulher, capaz de gerar filhos, é diferente daquela entre dois homens e duas mulheres, incapaz de gerar descendentes, que compõem a entidade familiar”. Ao meu ver, o que se reivindica hoje como reconhecimento pelo Estado é simplesmente uma apropriação indevida, por parte de um pequeno grupo, de uma instituição que historicamente, socialmente, culturalmente e espiritualmente tem se afirmado como fundamental na constituição social humana.
                                         (Pe. Idamor da Mota Jr)